sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

O Julgamento do mensalão é o surgimento de uma nova cultura política?


Todo brasileiro minimamente informado tem ciência do julgamento da Ação Penal 470 (apelidada pela grande mídia de “Mensalão”). O processo envolveu diversas pessoas de diversas posições políticas e sociais.
Dentre esses foram condenados 25, pertencentes ao PTB, PL, PP, PMDB, além de um diretor do Banco do Brasil, membros da cúpula do Banco Rural, gerente da SMP&B, sócios da corretora Bônus-Baval e uma série de sócios de Marcos Valério – juntamente com o próprio. Apesar da heterogeneidade, o caso ficou conhecido como vinculado estritamente ao PT devido ao fato dele ter, supostamente, articulado toda a rede de corrupção. Seria nesse sentido que o nobilíssimo Poder Judiciário teria agido, condenando e ofertando em sacrifício e oblações algumas figuras do Partido dos Trabalhadores. Dentre essas estaria o prato principal, a ser degustado com salivação palpitante: José Dirceu. Todo o espetáculo midiático que envolveu o julgamento e a condenação dele, em especial, seriam, na verdade, uma vontade popular. Estariam apoiadas na sede do povo de ver enfim os corruptos serem presos para, assim, ser iniciado um processo de moralização política que respeite o cidadão brasileiro. Com isso, na perspectiva de alguns membros esperançosos da esquerda, seria dado um grande passo em direção a uma cultura política mais democrática, que julga a todos, que não privilegia e nem perdoa corruptos. Acho bela a esperança. Entretanto, parece um grande equívoco imaginar que o julgamento e condenação de alguns réus desse processo seja, de maneira tão simples, um novo início.

Em primeiro lugar, é preciso pensar o papel da mídia em elaborar a questão, em mastigá-la e regurgitá-la para a massa. O papel da mídia, sem querer inventar a roda pela segunda vez, não é neutro. A esquerda e suas poucas alternativas midiáticas sabem que falar não é só uma arte, mas principalmente é ocupar um espaço de poder – de poder falar e de poder divulgar o que se fala. Quando a grande mídia resolveu acompanhar cada melindre do julgamento, fez opção política. Quando recortou a questão restringindo-a ao PT, fez uma opção política. Quando povoou a tele-tela de “Mensalão” durante a campanha para prefeito (principalmente a de São Paulo) fez uma opção política. Além disso, na medida em que apresentou a questão como “o maior esquema de corrupção do país”, eclipsou desvios de volumes maiores como o do caso da Privataria Tucana e suas centenas de bilhões. Escolha política.

Por fim, dado o breve espaço de que disponho, quem defende a emergência de nova cultura política, não tem claro que todo o processo vem sendo decidido no Poder Judiciário, onde não há representatividade popular. Os magistrados não são eleitos pelo povo. E, no entanto, são eles que arbitram sobre a questão. E arbitram arbitrariamente, pois passam inclusive por cima dos preceitos da teoria do “domínio do fato” a ponto de serem criticados pelo próprio idealizador da teoria. E por que o atropelamento? Ora, para ofertar àquilo que vem sendo chamado de “vontade popular” o seu anseio de caça à corrupção. Pena que a “vontade popular” é discurso da mídia para esconder seus anseios políticos, afinal, que representatividade tem ela para falar por todos? Política boa, para a grande mídia, é essa que acontece no interior do Poder Judiciário, sem o povo, aliás, sob uma “vontade popular” que pode ser controlada, adestrada, que se pode facilmente dizer o que ela é e o que ela não é. Questões finais: é essa a nova cultura política que a esquerda quer? Política sem povo, política da mídia?


por Felipe Tavares, Professor  de História



Sobre o problema da teoria do “domínio do fato” supra-citada, ver: www.advivo.com.br/
  

1 comentários:

Maumau disse...

Uma boa reflexão, Felipe. Eu, particularmente, responderia negativamente a indagação que fazes. Qual seja: não vejo uma nova cultura política surgir.
Em que pese as controvérsias e erros políticos do PT, concordo com o Mino Carta quando ele diz que o que vulgarmente nos habituamos a chamar de mensalão, ainda está por provar-se.
Isto, conforme ponderava, não exime o PT de responsabilidades, mas daí a se chegar a farsesca ação penal 470 e forma ímpar como o processo foi julgado, o que fica explicito é a emergência de um julgamento político, de exceção.
Não percebo a emergência de uma nova cultura política, mas a transformação dos STF em ator político decisivo, agora numa perigosa triangulação entre a "mídiazona" brasileira e forças políticas conservadores, sem grande expressão popular, mas com muito poder e voz na mídia, e tendo suas premissas assumidas escandalosamente por ministros do STF.
É um processo lamentável e que traz sérios riscos a democracia brasileira. 2013 será um ano pesado. Será preciso muito estômago para acompanhar a o sagramento a que se tentará levar o PT.

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